Estudos Teológicos 2001, v. 41, n. 2, p. 39-58

Batismo e fé: sobre uma relação polêmica. Réplica a Marcos Kruse
Gottfried Brakemeier

Resumo
O batismo pressupõe a fé da pessoa batizanda? Em caso de resposta afirmativa, estaria excluída a possibilidade do batismo de infantes. Mas esta é uma questão secundária. No fundo trata-se de clarear a relação que há entre o agir de Deus, de um lado, e o do ser humano, de outro. Reside aí uma armadilha teológica: Se é somente a graça que salva, como evitar o determinismo que desincumbe a pessoa humana de responsabilidade própria? Se, inversamente, for acentuada a necessidade da fé, como fugir do sinergismo que faz da salvação uma obra conjunta de Deus e do ser humano, diminuindo a graça? O presente artigo avalia essa questão fundamental da teologia a partir da relação que há entre o batismo como um agir de Deus e a fé como um fazer humano, buscando um caminho entre os extremos apontados acima. Diz a Bíblia que o ser humano é justificado somente por graça e somente por fé. Como entender esse duplo “somente”?

Resumen
¿El Bautizo presupone la fe de la persona bautizada? En caso de la respuesta ser afirmativa, estaría excluída la posibilidad del bautizo en la infancia. Más esta es una cuestión secundaria. En el fondo se trata de clarear la relación que hay entre el actuar de Dios, de un lado, y el del ser humano, del otro. Reside ahí una emboscada teológica. Si es solamente la gracia la que salva, ¿cómo evitar el determinismo que quita de la persona humana su propia responsabilidad? Si, inversamente fuese acentuada la necesidad de la fé, ¿cómo escapar del sinergismo que hace de la salvación una obra conjunta de Dios y del ser humano, disminuyendo la gracia? El presente artículo valora esa cuestión fundamental de la teología a partir de la relación que hay entre el bautizo, como un “actuar de Dios”, y la fé como un “hacer humano”, buscando un camino entre esos extremos mencionados. Dice la Bíblia que el ser humano es justificado solamente por gracia y solamente por fé. ¿Cómo enterder ese doble “solamente”?

Abstract
Does baptism presuppose the faith of the person being baptized? If the answer is affirmative, than the possibility of baptizing infants would be excluded. But that is a secondary issue. At the root we are dealing with clarifying the relationship between God's action on the one hand, and the human being's action on the other. There is a theological trap in this: If only grace saves how does one avoid the determinism that acquits the human person from their own responsibility? Inversely, if the need for faith is accentuated how does one get away from the synergism that makes faith a joint effort of God and the human being, diminishing grace.? The current article evaluates this fundamental issue in theology beginning with the relationship between baptism as an action of God and faith as a human action, seeking to find a path between the extremes pointed out above. The Bible says that the human person is justified only by grace and only by faith. How does one understand this double “only”?

1 - O sujeito da salvação – afinal quem é?

Diz o apóstolo Paulo que o ser humano é justificado por graça e por fé. Nesta equação, esconde-se um problema: como se relacionam o agir gracioso de Deus, de um lado, e a fé humana que lhe responde, de outro? Porventura, estariam se complementando mutuamente no sentido de Deus fazer a sua parte e o ser humano a dele? Isto significaria diminuir a graça divina e transformar a fé em obra, pela qual o ser humano cooperaria em sua própria salvação. O resultado seria o sinergismo, que faz da salvação uma promoção conjunta de Deus e da criatura. Como é sabido, o principal expoente de tal concepção tem sido Pelágio, desde cedo considerado herege na Igreja. Com o anátema sintoniza expressamente a Confissão de Augsburgo (cf. Art. II)1. Inversamente, se justificação acontece somente por graça, sob desvalorização da fé, o resultado seria um determinismo que iria desincumbir as pessoas de sua responsabilidade e degradá-las a joguetes passivos nas mãos de Deus. Como sair do impasse?

A teologia cristã conhece a armadilha e procura evitá-la. Ainda assim, a maneira de conjugar a graça e a fé permanece controvertida, não por último entre católicos e luteranos. O sola gratia, defendido pela Reforma, tem sido acusado de produzir efeito paralisador, devendo ser complementado por algum esforço próprio do ser humano, seja em forma de adesão consciente à fé, seja em forma de boas obras “meritórias”. A recente Declaração Conjunta de católicos e luteranos sobre a justificação não conseguiu dirimir todas as dúvidas a esse respeito2. Há unanimidade na condenação de ambos os descaminhos. Mas contornar o sinergismo sem cair no determinismo e vice-versa não é nada fácil3. A discussão, de modo algum, está encerrada.

Ilustra-o, a seu modo, o artigo de Marcos Kruse, intitulado Considerações sobre o batismo à luz do rebatismo e da teologia anabatista4. Procura desarmar os espíritos entre luteranos e anabatistas, ou melhor, menonitas, num ensaio de diálogo e de construção de pontes. A questão crucial revela-se como sendo a relevância da fé, respectivamente da profissão de fé. Conforme M. Kruse, o batismo será nulo sem os dois elementos externos que, no seu entender, perfazem sua natureza e que são (a) a invocação do triúno Deus e (b) a confissão de fé da pessoa batizanda. Nessas condições, fica descartado o batismo de lactentes, incapazes que estão de crer e de solicitar o batismo por livre e própria vontade. Sem fé, não há salvação. Não havia o próprio Lutero insistido em que o batismo deve estar acompanhado da fé da pessoa que a ele se submete? M. Kruse, assim se poderia concluir, defende o sola fide. Também este tem sido uma bandeira da Reforma do século XVI. Mas como defender este princípio sem prejudicar o outro, o sola gratia?

A questão reveste-se de significado paradigmático. Coloca-se não só com relação ao batismo. Quando se fala na “construção do reino de Deus”, por exemplo, deparamos com a mesma problemática. Qual o papel da ação humana na construção de um mundo melhor? O reino de Deus virá por si mesmo, como dizia Lutero no Catecismo Menor5? Ou sua concretização histórica exigirá o mutirão das pessoas engajadas? O assunto tem merecido especial atenção por parte de teólogos latino-americanos, solícitos também eles em evitar o extremo sinergista e o determinista. Conforme José Míguez Bonino, não se trata de alternativas. Pois: “Uma vez que vemos a iniciativa divina como sendo a ação de Deus na história (...) não só estamos autorizados, como também obrigados a utilizar a vigorosa linguagem do crescimento, da realização e da criação.”6 Em outros termos: a implantação do reino de Deus, por concretizar-se em transformações históricas libertadoras, exige a decidida participação humana. Embora dependa de iniciativa divina, o ser humano seria construtor desse reino. Claro que está fora de seu alcance produzir a plenitude escatológica. E, no entanto, dever-se-ia atribuir à sua ação transformadora função “causativa” para a chegada do reino.

Pois é! Estaremos à beira de um novo sinergismo? Que diaconia cristã, tanto a caritativa quanto a política, deve ter efeito salvífico para outras pessoas, é boa doutrina luterana7. A própria Bíblia o corrobora: os apóstolos são chamados por Paulo de “cooperadores de Deus” (1 Co 3.9; cf. Cl 4.11). E, todavia, a pergunta pela participação própria do ser humano na construção do reino de Deus ainda não está respondida. Cooperação humana acrescenta algo à obra de Deus? Como surge e qual o seu alcance?

É preciso avançar até mesmo um passo a mais. Pois o problema repete-se em qualquer antropologia. Como conjugar a experiência da passividade e da atividade na vida humana? O ser humano não se produziu a si mesmo. Antes de se tornar ativo, recebeu. Há determinantes não escolhidos na trajetória das pessoas. Não obstante, cada qual carrega enorme responsabilidade para o feliz desfecho de sua biografia. Gratuidade não é nenhuma invenção teológica. É um dado antropológico. Portanto, o que é possível “conquistar” por próprio esforço? E quanto há para “agradecer” por coisas que são simplesmente “dádivas”? Também sob este ângulo ressurge o dilema do sinergismo e do determinismo, ambos impróprios para servirem de solução.

Nós vamos ater-nos à questão do batismo em sua relação com a fé. Os horizontes serão os referidos acima. M. Kruse apontou para um ponto nevrálgico da teologia, motivo de divergências entre as Igrejas e relevante na América Latina. As reflexões concentrar-se-ão na temática em apreço. A réplica a M. Kruse será antes indireta do que direta, não se prendendo detalhadamente a cada uma das asserções. A discussão explícita foi remetida para as notas de rodapé. Tentarei esclarecer algo melhor a tensão que há entre graça e fé como atividade divina e humana, respectivamente. Isto numa perspectiva bíblica e luterana.

2 - Exigências do diálogo

Repito que a discussão com M. Kruse deve-se à relevância do assunto, não ao nível de sua polêmica. Esta merece enérgico protesto. Por demais vezes, substitui o argumento pela ofensa pessoal. Particularmente a minha pessoa está na mira8. Sou acusado de bobagens, ignorância, de afirmações descuidadas e até mesmo idolátricas. O leitor e a leitora devem obter a impressão de eu não ser pessoa séria. O estilo lembra o antigo combate aos hereges que iniciava com a desmoralização das pessoas dissidentes a fim de, desde já, desacreditá-las. Algo análogo vale com relação à instituição de formação teológica da IECLB, a EST. Que batismo e santa ceia não sejam estudados com a devida seriedade, sendo antes relegados para a teologia prática, é uma inverdade que vai danificando injustamente a imagem desta casa.

Se pelo menos as acusações fossem consistentes! Mas não o são, do que segue apenas um exemplo. Eu havia dito que o batismo deve ser crido. Isto está sendo tachado como fala descuidada. Pois: “A fé se dirige somente a Deus. O batismo nada mais concede além do que a fé proporciona. Pensar doutra maneira é idolatria (primeiro mandamento).”9 Ora, se assim é, o Credo Apostólico é insuportavelmente idolátrico. Ensina a crer na Igreja, na remissão dos pecados e na vida eterna. Ademais, já Agostinho havia insistido na diferença entre o “crer em” e o “crer alguma coisa”. No fundo, o “crer em” está reservado às três pessoas da Trindade. Para a Igreja vale credo ecclesiam, ou seja, “eu creio a Igreja”. A tradução “creio na Igreja” não é exata, muito embora receba respaldo do Credo Niceno-Constantinopolitano, onde nós lemos exatamente assim10. Se batismo é promessa, como diz Lutero no Catecismo Menor, ele deve ser crido. Não cremos “no batismo”, mas cremos “o batismo”, assim como também a palavra de Deus deve ser crida. É exatamente isto o que eu havia dito. Recomenda-se não confundir as coisas. A divergência mostra que, no fundo, temos outra compreensão do que seja o batismo. Voltarei ao assunto.

A polêmica contundente de M. Kruse desabona seus propósitos. Diz ele: “Julgar e condenar é muito mais fácil do que compreender e aceitar conforme os ensinamentos de Cristo.”11 Ótimo! Por que então tanta condenação e tanta agressividade? Eu poderia dar o troco com a mesma moeda. Não faltaria a munição. Mas não descubro nenhum proveito para o evangelho de Cristo em tal retaliação. Nem sempre nossas posições convergem. Significa isto que devemos ser inimigos? Em tempos idos, estudávamos teologia juntos em São Leopoldo, luteranos e menonitas, apesar das diferenças doutrinais. Tínhamos amizades, algumas das quais perduram até hoje. Não vejo razão para a fúria teológica. Vamos ouvir-nos mutuamente, e, mesmo que não seja possível o consenso, talvez consigamos aprender alguma coisa uns dos outros. O bom diálogo exige sejam cumpridas algumas exigências formais. Mas, retornemos ao tema que nos temos proposto.

3 - Origem e natureza da fé

1. A fé que justifica é a fé em Jesus Cristo (Rm 3.22), por quem Deus reconciliou o mundo consigo mesmo (2 Co 5.18s). O evangelho convida a confiar no Deus que amou ao mundo ao ponto de por ele dar seu Filho unigênito (Jo 3.16)12. Portanto, a fé tem a graça de Deus por conteúdo e se expressa numa vivência correspondente. Em última instância, ela é fé no trino Deus, que é o mesmo em todas as suas manifestações. Conforme Lutero, crer não consiste prioritariamente no consentimento com uma doutrina. É antes sinônimo de temer e amar a Deus e confiar nele acima de todas as coisas13.

2. Esta fé não é um dado natural do ser humano. Precisa ser aprendida. Isto acontece mediante o ouvir da palavra de Deus (Rm 10.17). A fé, para nascer e para durar, precisa do testemunho externo que, aliás, inclui o gesto. A palavra de Deus jamais se resume num fenômeno meramente acústico. A aprendizagem da fé requer toda uma experiência de vida. Não há garantia de sucesso. Pois a educação que lança a semente fica a mercê do Espírito Santo que dá o crescimento.

3. A palavra de Deus é anterior à fé. É sua condição e seu fundamento. A fé também não valida a palavra de Deus. Esta é válida independentemente de aceitação ou rejeição. Fé somente acolhe, assimila, recebe. É profundamente re-ação, não iniciativa própria. Exige trabalho, esforço com “temor e tremor” (Fp 2.13). Quem cruza os braços na espera de um milagre do céu, sairá de mãos vazias. Ainda assim, fé autêntica jamais é “obra”. Nunca passa a ser conquista, pela qual o ser humano pudesse vangloriar-se. Será sempre experimentada como dádiva, assim como acontece com todo verdadeiro amor. Provocará legitimamente a gratidão. A fé tem em Deus sua origem e seu autor, muito embora deva ser vivida pelo ser humano.

4. Pode o ser humano rejeitar a fé? Claro que o pode! Caso contrário, seria enigmática a origem do pecado. Deus não violenta as pessoas, aniquilando-lhes a vontade e a pessoalidade14. Cabe resistir, nesse tocante, a esporádicas afirmações luteranas, perigosamente próximas do já mencionado determinismo. Fé e descrença não são fatalidades ou imposições divinas. Se fossem, a revolta contra Deus já não mais poderia ser computada como culpa. Isto não significa reafirmar o “livre arbítrio” do ser humano em relação a Deus, como se fé fosse uma opção qualquer. Na realidade, existe apenas uma opção livre que é a de permitir sermos motivados por Deus à fé, de nele depositar a confiança e de seguir-lhe a vontade. Não que Deus impedisse o ser humano de enveredar por outro caminho. Mas a escolha de tal caminho seria loucura, obsessão. É como na lei de trânsito: Livre é apenas o motorista que concorda com o legislador no sentido de usar a faixa direita das rodovias. Quem acha ter o direito a uma opção própria, diferente da do legislador, vai provocar tragédias. Não será pessoa livre, e, sim, tola. Deus não priva o ser humano de sua vontade e de seu juízo. Mostra-lhe, entretanto, não haver salvação para o filho e a filha fora da casa paterna.

5. Há uma diferença entre a fé do coração e a fé da boca (cf. Rm 10.10). Uma não existe sem a outra. Mas as duas também não se identificam. A fé da boca que se exterioriza em “confissão”, “credo”, “testemunho” é verificável e testável. Enquanto isso, a fé do coração está oculta. Só Deus a enxerga. Tradicionalmente se fala em fides quae e fides qua para distinguir a fé como conteúdo e a fé como ato15. A boca pode mentir e dizer outra coisa do que o coração crê. Jesus insiste: “Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus (...)” (Mt 7.21). Importa respeitar a diferença entre confiança e confissão. Então, se é a fé na graça de Deus que justifica, qual será a função do batismo?

4 - O batismo como palavra

Pois sem a palavra de Deus, a água é simples água, e não batismo. Mas com a palavra de Deus, a água é batismo, isto é, água de vida, cheia de graça (...).” Assim Lutero, no Catecismo Menor. Isto significa:

1. Sacramento é palavra de Deus. A tradição luterana, nesse tocante, anda nas pegadas de Agostinho que havia distinguido entre “palavra audível” (a prédica) e “palavra visível” (o sacramento)16. Sacramento é palavra acrescida de um sinal, no caso do batismo, a água. Sujeito atuante é Deus, enquanto o ser humano é puramente receptor. Expressam-no as formas passivas que o Novo Testamento emprega com respeito ao batismo. Reside nisto uma herança de João Batista17. Ninguém batiza a si mesmo. Nós somos batizados (!) em nome de Jesus Cristo (Gl 3.27), respectivamente em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo (Mt 28.19). O batismo é uma articulação do evangelho. Fator constituinte não é a fé, e sim, a palavra divina.

2. Pregação e sacramentos não se distinguem pelos efeitos que produzem. Estes são os mesmos e consistem na salvação concedida por Deus. Ambos distinguem-se pela modalidade em que a transmitem. Água é sinal de purificação, pão e vinho de alimento. A palavra de Deus não se resume em informação. Ela é operante, concreta, afeta o corpo. Transforma as pessoas e as sustenta. Enquanto batismo e eucaristia têm índole verbal, a boa pregação terá índole sacramental18. Devem ser afastadas, isto sim, concepções mágicas. O batismo, como mero rito, não produz nenhum milagre, assim como também a palavra falada do evangelho não permite ser abusada como feitiço. É errôneo atribuir ao sacramento efeito automático (ex opere operato). O batismo, como tal, não salva. É Cristo quem salva, usando o batismo como meio de comunicação. Somente neste sentido falamos dos sacramentos (e da pregação) como “meios de salvação”.

3. O que acontece no batismo pode ser descrito como sendo a “incorporação em Cristo”. O apóstolo Paulo vai dizer que somos imersos na morte de Jesus (Rm 6.3s), que somos revestidos por Cristo (Gl 3.27), que passamos a ser sua propriedade (Gl 3.29). De acordo com Jo 3.3,5; Tt 3.5 e outras passagens, somos regenerados ou renascidos por este lavar. Somos justificados. O batismo é uma forma de integrar a pessoa no evento de Cristo e de lhe transmitir a salvação que nesse evento está implícita19. Para evitar mal-entendidos repetimos: não é o batismo que produz esses efeitos. A salvação está “em Cristo”. No fundo, é ele o único e verdadeiro sacramento20. Mas o batismo é uma das mais importantes visualizações da obra redentora de Deus. Quem rejeita o batismo nessa qualidade, deve concentrar toda mediação da salvação na pregação oral, sem a qual Deus ficaria definitivamente afônico. O batismo é uma forma de “evangelho aplicado”. E isto no indivíduo que por ele está sendo inserido no corpo de Cristo (1 Co 12.13) com todos os benefícios e compromissos que daí resultam. Enquanto o batismo se destina à pessoa individualmente, a santa ceia é o sacramento para a comunidade.

4. A compreensão do batismo como imersão no evento de Cristo espelha a origem remota desse sacramento nos banhos de purificação, comuns no judaísmo e em outras religiões da época. “Batizar” significa “submergir”21. João Batista, desse modo, “batizava” as pessoas no rio Jordão. Também na primeira cristandade era comum a imersão da pessoa batizanda na água. Mas, já muito cedo, admitia-se igualmente a aspersão. No livro da Didaquê, uma ordem eclesiástica redigida no final do primeiro ou no início do segundo século da nossa era, lemos: “No que diz respeito ao batismo, batizai em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo em água corrente. Se não tens água corrente, batiza em outra água; se não puderes em água fria, faze-o em água quente. Na falta de uma e outra, derrama três vezes água sobre a cabeça em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.”22 É verdade que a aspersão é vista como solução de emergência, da mesma forma como o uso de água parada num tanque. Não obstante, o batismo de aspersão, de modo algum, é considerado inválido.

Isto faz jus ao fato de a água do batismo ser apenas um sinal. Água é capaz de remover sujeira, mas não pecado. Por isto, importa sermos imersos em Cristo e sua morte, não necessariamente na água. É de admitir que a substituição da imersão pela aspersão prejudica o simbolismo. Entretanto, não é a água que faz o efeito do batismo, e, sim, “a palavra de Deus que está unida à água (...)” (Lutero)23. Paralelo interessante temos em João 13.1-11. Pedro considera insuficiente a lavagem dos pés somente. Quer mais. Quer que Jesus lave-lhe também as mãos e a cabeça. Ele pensa em termos quantitativos, no que Jesus o deve corrigir. A validade do batismo, assim devemos concluir, independe da quantidade de água usada.

6. Do batismo nasce o imperativo. O apóstolo Paulo o formula assim: “Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também nós andemos em novidade de vida” (Rm 6.4). Vale sublinhar que, por enquanto, somente Cristo ressuscitou. Para nós, ressurreição é esperança futura (Rm 6.5). Também após o batismo, pois, vida humana, de modo algum, está imune contra o pecado. Se fosse diferente, seriam incompreensíveis as numerosas exortações no Novo Testamento que se dirigem às pessoas batizadas. Na vida cristã, o pecado ainda não morreu. Mas nós temos morrido para o pecado (Rm 6.2). Isto significa que, “em Cristo”, conseguimos a liberdade para novidade de vida, no serviço a Deus e sua santa vontade (Rm 12.1s)24. Batismo é vocação para a vivência da liberdade cristã que paradoxalmente se documenta em nova obediência (Confissão de Augsburgo, Art. VI), ou seja, numa conduta não segundo a carne e, sim, de acordo com o Espírito.

5 - A fé – um pressuposto do batismo?

1. A primeira impressão que se obtém na leitura do Novo Testamento parece sugerir resposta positiva a esta pergunta. Na primeira cristandade, a prédica e a conversão das pessoas precediam o batismo. Nada ouvimos sobre um eventual batismo de lactentes. Se estavam incluídos na “casa”, ou seja, na “grande família” (cf. Jo 4.53; At 11.4; etc.) permanece hipotético. O apóstolo Paulo, por exemplo, confessa ter batizado a “casa” de Estéfanas (1 Co 1.16; cf. At. 16.15). Mas ele não diz ter batizado crianças. Também o paralelo traçado em Cl 2.11 entre a circuncisão judaica, sempre praticada no oitavo dia de vida do menino, não pode ser arrolado como testemunho. A referência é por demais insegura. Por outro lado, porém, não há passagens no Novo Testamento, insinuando que bebês devem ser excluídos do batismo. Não conhecemos o suficiente a prática batismal da primeira cristandade para chegar, nesse tocante, a uma conclusão25. É pressuposto, isto sim, que, quem abraçou a fé, também se submete ao batismo.

2. A seqüência “prédica, conversão, batismo” é reflexo da situação missionária da Igreja das origens. Portanto, ela é circunstancial. Vai sempre repetir-se em situação missionária. Onde não há pais cristãos, também não pode haver batismo de infantes. A pergunta chave é se existe uma necessidade teológica dessa seqüência. Nesse caso, o batismo seria nulo sem a fé. É o que não se pode deduzir do Novo Testamento, sendo duas as principais razões:

a. A primeira reside no caráter re-ativo da fé, como exposto acima. Ela não é “produção religiosa”, que viesse a “merecer” a graça de Deus. Também no caso do batismo, a graça conserva a absoluta primazia. A fé é resposta. Ela não “habilita” para receber o batismo. É antes acolhida do mesmo.

b. O outro motivo é a invisibilidade da verdadeira fé. Quem decide quando uma pessoa terá fé suficiente para ser batizada? Não adianta alegar a confissão. O alerta de Lutero nesse tocante ainda hoje é válido. Disse ele: “Em terceiro lugar (...) eles (sc. os anabatistas) se fundamentam na palavra: ‘Quem crer e for batizado será salvo’. Desta eles querem concluir que ninguém deve ser batizado a não ser que ele creia. Aí eu digo que eles são muito atrevidos. Pois se eles querem seguir esta opinião, não devem batizar ninguém antes de saberem seguramente que o batizando crê. Mas como e quando eles querem saber isto? Porventura são eles deuses que enxergam os corações da gente, se eles crêem ou não crêem? (...) Bem, dizes tu, ele está confessando que ele crê. Meu amigo. Deixa-o confessar o quanto quiser. O texto não diz: ‘Quem confessar’, mas ‘Quem crer”. Tu tens a sua confissão, mas a sua fé não conheces.”26 Portanto, um pretenso batismo de crentes defronta-se com intransponíveis obstáculos práticos. É inviável. Já por esta razão, não pode ser sustentado.

3. Verdade é que o batismo busca a fé. Quer ser assumido. Sem a fé da pessoa batizada, o batismo não alcançou seus objetivos. Mas a seqüência cronológica que faz seguir o batismo à conversão não é obrigatória. Esperamos que, assim como a palavra audível, assim também a palavra visível produza a fé. Para que isso aconteça é essencial sermos lembrados da obra de Deus em nós. É esta a tarefa da educação religiosa e da catequese. A prática do batismo de bebês pressupõe, por isto, o ambiente da família cristã e da comunidade cristã. Implica o compromisso com a catequese. E, no entanto, também sem fé o batismo, de modo algum, reduz-se a nada. Incredulidade humana é incapaz de invalidar as promessas de Deus27. Isto o apóstolo Paulo tem esclarecido terminantemente no caso de Israel, em Rm 9-11. O mesmo aplica-se ao evangelho. Sua validade independe de favores humanos. Não temos nem autoridade nem poder para ratificar, aprovar ou anular a ação de Deus. Quem não faz caso de seu batismo ou quem o rejeita, priva a si mesmo da graça de Deus. Exclui-se da comunidade. E, no entanto, é como na parábola do filho pródigo: o pai não esquece seu filho. Continua fiel a ele e aguarda sua volta.

4. Então, o batismo é necessário para a salvação? A pergunta é inevitável e costuma expressar-se na preocupação com pessoas que morrem sem terem recebido o sacramento. A resposta foi dada magistralmente por Edmund Schlink. Claro, o batismo é necessário. Ele é tão necessário como o é o testemunho oral do evangelho. É nesse sentido que também deve ser entendido o Art. IX da Confissão de Augsburgo, categórico no assunto28. Entretanto: “O conceito da indispensabilidade do batismo para a salvação se torna falso, se com ele se antecipa o juízo final de Deus sobre os não batizados.”29 Assim como não há “garantia de salvação” para os batizados (cf. 1 Co 10.12), assim não há “garantia de perdição” para os não batizados. Também sem batismo salvação é possível. Quem o nega, coloca algemas nas mãos de Deus e se torna culpado de intolerável atrevimento. Ademais, condicionar a salvação ao rito do batismo, significaria atribuir-lhe uma função absoluta, independente da pregação oral, o que não corresponderia à sua compreensão como uma forma de Deus dirigir-se ao ser humano30. Inversamente não se permite, sob recurso a tais constatações, relativizar o batismo e dar-lhe caráter opcional na vida da comunidade.

6. “Mas se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele” (Rm 8.9). Andar segundo Espírito é característica de existência cristã como tal, ou ela não é cristã31. De acordo com o apóstolo Paulo, “estar em Cristo” e “estar no Espírito” são sinônimos. Por isto, enquanto o batismo for realizado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ele coloca a pessoa na esfera em que o Espírito Santo governa. No Novo Testamento, a distinção entre “batismo de água” e “batismo do Espírito” assinala a diferença entre o batismo de João Batista e o batismo cristão (cf. Mc 1.8; At 19.1s). Mas é improcedente como diferenciação de duas modalidades cristãs desse rito32. Iria separar Jesus do Espírito. Outra questão é, se a concessão do Espírito Santo sempre se faz acompanhar de “sinais e prodígios”, respectivamente de determinadas experiências pneumatológicas ou carismáticas. Aí a resposta bíblica é claramente negativa. Os dons do Espírito podem ser de ordem essencialmente não espetacular, sendo o critério de avaliação dos mesmos o amor (1 Co 12-14). O Espírito Santo tem muitas maneiras de se comunicar. Mas ele não se divorcia de Jesus Cristo, de modo que batismo de água em nome de Jesus contará também com a sua presença.

6 - Conclusões

1. O primeiro resultado a destacar é que se proíbe confundir “batismo de adultos” e “batismo de crentes”33. Não são a mesma coisa. A fala em “batismo de crentes” é teologicamente insustentável. Pessoa confessa não é necessariamente pessoa crente. Há mais outros inconvenientes a apontar. A insistência nas “provas da fé” a serem apresentadas pela pessoa batizanda inevitavelmente faz ressurgir o fantasma do sinergismo. Qual será o tamanho da fé que seja bastante para obter a graça? Se fé se tornar “meritória”, ela se transforma em obra que não justifica. Ademais, é comum nessas condições ter início um processo de padronização da piedade, aliás, elitizante. Pois a confissão de fé abalizada, bem como a vivência da mesma, pressupõe certo grau de instrução. Como fica o caso de deficientes mentais, por exemplo? Terão acesso ao batismo? Padronização da piedade pode facilmente submeter as pessoas a regime legalista e, até mesmo, conduzir a divisões na comunidade. As igrejas pentecostais para tanto oferecem exemplos. É claro que vivência da fé não permite ilimitada tolerância. E, no entanto, ela se exprime em extraordinária riqueza de formas, ameaçada de atrofiamento por coação de qualquer espécie.

2. A fala em “batismo de crentes”, no fundo, implica outra compreensão de sacramento. O batismo já não mais é visto como palavra, sacramento, ação de Deus, e, sim, como uma ordenança a ser cumprida. Ele torna-se uma expressão da obediência da fé. Sem esta fé, o batismo seria nulo34. Por isto, assim se supõe, não se incorre em rebatismo quando a pessoa, sob profissão da fé, for batizada de novo em idade adulta. O primeiro “batismo”, em idade de bebê, simplesmente não existiu. Assim argumentaram os “anabatistas”, contemporâneos de Lutero35. Transformaram o batismo numa promoção humana. Ainda que as igrejas batistas de hoje defendam posições mais diferenciadas36, estão vivas as idéias que concebem o batismo antes como documentação da fé do que como manifestação da graça de Deus. A Bíblia, assim entendemos, não corrobora tal visão.

3. Enquanto isso, o “batismo de adultos” é “discutível” e digno de avaliação. Evita uma série de problemas, típicos do batismo de lactentes. Possibilita às pessoas a decisão autônoma, dispensando padrinhos, madrinhas e outros substitutos. Representará um evento significativo na biografia das pessoas, vivido e lembrado conscientemente. Por essas e ainda outras razões, uma eventual mudança da prática batismal goza de simpatias também em igrejas luteranas37. A adoção do batismo de maiores poderia fazer frente ao que D. Bonhoeffer tem chamado de “graça barata”38 e frear o “determinismo” que se instala sempre que responsabilidade humana é desprezada. A pessoa passaria então a ser somente “vítima”, o que é profundamente antibíblico. Uma das causas desse mal seria a rotina do batismo de infantes. Ele está sendo denunciado como fator de indiferença religiosa. Da introdução do batismo de adultos espera-se recuperação de consciência evangélica nas comunidades e renovação de compromisso evangélico de seus membros. E, no entanto, a mudança teria alto preço.

4. Pois não há documentação mais eloqüente da gratuidade a que o ser humano deve sua vida do que o batismo de infantes. Justamente a dependência, a carência, a “menoridade” da criança recém-nascida é ilustrativa para a situação do ser humano perante Deus. Somos receptores em sentido radical, mendigos, como diria Lutero. É porque o reino de Deus só pode ser recebido na condição da criança (Mc 10.15). O apóstolo Paulo pergunta: “(...) que tens tu que não tenhas recebido?” (1 Co 4.7). Ele confessa que Deus o separou desde “o ventre materno” e o vocacionou por sua graça (Gl 1.15). Não foi consultado quanto à sua concordância. Deus não condiciona seu amor ao beneplácito humano. Se fosse diferente, estaria de antemão inviabilizado seu amor a pecadores, inimigos. Pois estes nunca dariam anuência. O batismo de lactentes é escandaloso justamente por esta razão: Como pode um ser tão flagrantemente “descrente”, indefeso, inconsciente, ser submetido a rito de tamanha relevância? Batismo de crianças pode parecer ilícita imposição. Mas não o é. Pois amor autêntico jamais é violência. Batismo de crianças é lembrança e sinal de vital gratuidade.

5. Essa lembrança ocorre num mundo terrivelmente fixado na lei da conquista e da produtividade. Faz parte do orgulho do ser humano ser autônomo e não depender de favores alheios. No nível das relações humanas, isto, até certo ponto, é compreensível. Ainda assim, a “autoprodução” do ser humano é ilusória por ignorar a sua dependência do meio ambiente, bem como de fatores históricos, biológicos e outros. O ser humano não é dono nem de si nem do mundo. Embora seja construtor de cultura, vive essencialmente de patrimônio emprestado, de herança e de dádivas. Sua produção é secundária em comparação com a “matéria-prima” recebida. A desconsideração dessa verdade acarreta prejuízo. Sufoca a gratidão e a substitui pelo ufanismo. Constrange o amor. Pois esse não se compra nem se paga. Amor só vinga na atmosfera da gratuidade. Batismo de lactentes que dignifica um ser por excelência improdutivo, dependente, e que o acolhe na comunidade é provocação salutar e mesmo indispensável em sociedade comandada pela lei das obras.

6. Para que essa provocação seja percebida, deverá ser promovida teologia do batismo nas comunidades. O problema do analfabetismo em assuntos de fé, da indiferença e do abuso do sacramento decorre não tanto de indevida prática batismal, e, sim, de dificuldades com a educação religiosa39. Não raro, a aprendizagem da fé estagnou no nível infantil. Há entraves na comunicação do evangelho. Eles tolhem o entusiasmo com a fé ou asfixiam sua semente de antemão. A explosão de nova religiosidade, de modo algum, é índice de renovação cristã. Vai depender de exame. De qualquer maneira, em momentos de crise, a divisa não deveria consistir em separar o trigo do joio e em congregar os restos dos fiéis. Urgente é a articulação ofensiva do evangelho num mundo secular e multirreligioso, em conexão com o esforço por elevar o grau de formação teológica dos membros. Somente o catecumenato permanente há de edificar comunidade adulta, apta a exercitar o sacerdócio dos crentes40.

7. Então, estaremos diminuindo a importância da atividade humana em Igreja e sociedade? Em outros termos: será inevitável que o sola gratia colida com o sola fide? Ora, isto será o caso somente se for desconsiderada a natureza atuante da fé. É sabido que não se pode separar da fé o amor (Gl 5.6). Simultaneamente, porém, importa enfatizar que “receber”, “assimilar” e “aprender” são elementos constitutivos da estrutura formal da fé. Implicam trabalho. É imprescindível esforçar-se pela fé, “apropriar-se” da mesma, investir suor em sua aprendizagem, sabendo, ao mesmo tempo, que nada há para ser conquistado e tudo para ser recebido. Exclui-se o “sinergismo” pretensamente capaz de completar a obra inacabada de Deus. Ele ofende a Deus e produz senão a arrogância dos “justos”. Da mesma forma, porém, não se dá espaço ao “determinismo”. Deus apela à vontade do ser humano, à sua sabedoria, a seu juízo. Busca-lhe o consentimento. Não o reduz a máquina ou peça inanimada, não força a adesão à sua causa. Dá-lhe a liberdade de se ausentar de casa e de recusar o seu amor. Mas quando o ser humano volta, o que às vezes significa longa e penosa viagem, tudo é graça. Fé somente agradece.

8. É o que se aplica também ao reino de Deus. Ele pode ser somente recebido, jamais conquistado, devendo ser reafirmado, porém, que este receber implica ação. O reino de Deus exige mobilização. E, no entanto, assim como boas obras não produzem o Reino de Deus, sendo antes o seu reflexo, assim também o empenho político por justiça. Ele deverá ser entendido como “obediência”, ou seja como “atendimento” da vontade divina, não como iniciativa própria com que o ser humano estaria cooperando com Deus. É claro que o cumprimento da vontade divina traz salvação ao mundo. Antecipa algo da perfeição futura. Concretizam-se parábolas do reinar gracioso de Deus. Mesmo assim, o cumprimento da vontade de Deus não passa de simples dever humano (cf. Lc 17.7-10). Não possui nada de meritório ou glorioso. Permanece dependente da bênção que Deus dá. Considerando ainda que o reino de Deus não se produz por mudança de estruturas políticas somente, mas que exige um novo espírito, torna-se definitivamente problemático falar em construção do mesmo. O ser humano só pode construir reinos humanos. Estes podem estar mais próximos ou mais distantes do reino de Deus, podem obstruir ou preparar a vinda deste, podem servir ao bem-estar das pessoas ou acelerar a ruína. Mas somente Deus pode implantar o seu reino, sem que o ser humano ficasse dispensado do cumprimento da vontade divina e da aprendizagem da fé.

Nesta aprendizagem, Deus sempre chega primeiro. Ele está na origem da fé, do amor e da esperança. Ele é o Alfa em tudo, assim como também é o Ômega (Ap 1.8). Batismo de bebês visualiza essa primazia de Deus, incômoda sob muitos aspectos, e, todavia, verdadeira. O sola gratia quer ser acolhido sola fide e conduzir ao soli Deo gloria.

1LIVRO DE CONCÓRDIA : as confissões da Igreja Evangélica Luterana, São Leopoldo: Sinodal / Porto Alegre: Concórdia, 1980, p. 29.

2DECLARAÇÃO CONJUNTA SOBRE A DOUTRINA DA JUSTIFICAÇÃO, São Leopoldo: Sinodal / São Paulo: Paulinas / Brasília: CONIC, 1999.

3Veja o interessante estudo de Urbano ZILLES, A salvação é graça ou mérito?. In: Geraldo L. B. HACKMANN (Org.), Sub umbris fideliter: Festschrift em homenagem a Frei Boaventura Kloppenburg, Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999, p. 373-386.

4Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 40, n. 2, p. 53-76, 2000.

5Na explicação do “Pai Nosso”, in: LIVRO DE CONCÓRDIA, op. cit., p. 373.

6José MÍGUEZ BONINO, A fé em busca de eficácia: uma interpretação da reflexão teológica latino-americana sobre libertação, São Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 111; também Juan Luis SEGUNDO, Massas e minorias, São Paulo: Loyola, 1975, p. 59s, discute a relação entre ação política humana e vinda do reino de Deus, chegando a postular, para a primeira, função causal. O ser humano contribui com um elemento decisivo para o Reino.

7Lutero convida a sermos um Cristo para o próximo. Cf. Albérico BAESKE, Releitura de Lutero em Contextos de Terceiro Mundo, Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 30, n. especial, p. 21, 1990.

8As críticas de M. Kruse referem-se a meu artigo: Teses referentes à compreensão e à prática do batismo, in: Gottfried BRAKEMEIER, Enfoques bíblicos, 2. ed., São Leopoldo: Sinodal, 1987, p. 49-60.

9M. KRUSE, op. cit., p. 59, nota 31. O destaque é do próprio autor.

10Veja COMISSÃO DE FÉ E ORDEM, A confissão da fé apostólica: explicação ecumênica da fé apostólica segundo o Credo Niceno-Constantinopolitano, São Paulo : ISER / Porto Alegre: CONIC, 1993. especialmente 26.

11M. KRUSE, op. cit., p. 54, nota 4.

12A compreensão da fé como confiança e esperança é herança vétero-testamentária. Veja Artur WEISER, Rudolf BULTMANN, verbete pisteúo, etc., in: Gerhard FRIEDRICH (Ed.), Theologisches Wörterbuch zum Neuen Testament, Stuttgart: Kohlhammer, 1959, v. VI, p. 205s. Remetemos ainda a Leonhard GOPPELT, Teologia do Novo Testamento, São Leopoldo: Sinodal / Petrópolis: Vozes, 1982, v. II, p. 393s.

13Crer é dar razão a Deus, sujeitar-se a seu juízo e aguardar dele a misericórdia revelada em Cristo. Veja Hans Joachim IWAND, A justiça da fé, São Leopoldo: Sinodal, 1977, p. 11s; Paul ALTHAUS, Die Theologie Martin Luthers, Gütersloh: Gerd Mohn, 1962, p. 48s; cf. ainda Hans SCHÄFER, A mensagem da justificação pela fé, Blumenau: O. Kuhr, 1999, p. 35s.

14A já referida DECLARAÇÃO CONJUNTA entre católicos e luteranos avança neste tocante, eliminando antigos preconceitos. Cf. op. cit. § 19-21.

15Cf. Hans GRASS, verbete Glaube. V. Dogmatisch, in: Die Religion in Geschichte und Gegenwart. 3. ed. Tübingen, 1958. v. II, col. 1601s; Walter KASPER, Bekenntnis und Bekenntnisgemeinschaft in katholischer Sicht, in: Harding MEYER, Heinz SCHÜTTE (Eds.), Confessio Augustana: Bekenntnis des einen Glaubens, Paderborn: Bonifatius / Frankfurt am Main: O. Lembeck, 1980, p. 37s.

16Com relação à teologia do batismo de Lutero, veja Carlos Jeremias KLEIN, Presbiterianismo brasileiro e rebatismo, São Paulo: Simpósio, 2000, p. 25s; Wilfried HÄRLE, Dogmatik, 2. ed., Berlin/New York: Walter de Gruyter, 2000, p. 535s; Hans SCHWARZ, Robert W. JENSON, Locus 10: os meios da graça, in: Carl E. BRAATEN, Robert W. JENSON (Eds.), Dogmática cristã, São Leopoldo: Sinodal/IEPG, 1995, v. II, p. 306s; Albrecht PETERS, Kommentar zu Luthers Katechismen, Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1993, v. IV: Die Taufe und das Abendmahl, p. 28s. Em termos gerais, remetemos para Valter Maurício GOEDERT, Teologia do batismo, São Paulo: Paulinas, 1988.

17O batismo de João e o fato de Jesus ter-se submetido a ele tem sido fator fundamental na origem histórica do batismo cristão, muito embora haja flagrantes diferenças. Cf. Gerhard BARTH, Die Taufe in frühchristlicher Zeit, Neukirchen-Vluyn: Neukirchener, 1981. p. 23s; Edmund SCHLINK, Die Lehre von der Taufe, Kassel: Joh. Stauda, 1969. p. 19s; e outros.

18Veja Martin DREHER, Palavra e sacramento, Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 20, n. 3, p. 154-162, 1980; Wilfried HÄRLE, op. cit., p. 534s; Paul ALTHAUS, op. cit., p. 297s; Walter ALTMANN, Lutero e libertação: releitura de Lutero em perspectiva latino-americana, São Leopoldo: Sinodal / São Paulo: Ática, 1994, p. 139s.

19Gerhard BARTH, op. cit., p. 92s; Hans SCHWARZ, Robert W. JENSON, op. cit., p. 331s.

20Assim, com boas razões, Wilhelm HÜFFMEIER, Batismo – meio de salvação ou selo da justificação?, Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 13, n. 2, p. 64s, 1973, aliás, em sintonia com Karl Barth. E, com efeito, não se deve atribuir a um rito o que é prerrogativa de Jesus Cristo. Por outro lado, Jesus Cristo comunica-se visivelmente por ritos como estes.

21Albrecht OEPKE, verbete. bápto, etc., in: Gerhard KITTEL (Ed.), Theologisches Wörterbuch zum Neuen Testament, 2. ed., Stuttgart: Kohlhammer, 1957, v. I, p. 527s.

22Citação conforme DIDAQUÉ – ou: Doutrina dos Apóstolos, Introdução, tradução do original grego e comentário de Urbano Zilles, Petrópolis: Vozes, 1970, p. 18. O texto é citado também por Eugene L. BRAND, Batismo: uma perspectiva pastoral, São Leopoldo: Sinodal, 1982, p. 17s.

23Se assim é, por que a Igreja deveria adotar a prática da imersão na água, como quer M. Kruse? (M. KRUSE, op. cit., p. 57). À parte do aspecto ilustrativo, qual seria o ganho?

24O batismo fundamenta a ética cristã. Nas cartas do Novo Testamento, na grande maioria dos casos, a exortação não prepara o batismo, mas segue a ele. Günter BORNKAMM, Taufe und Neues Leben bei Paulus, in: id., Das Ende des Gesetzes: Gesammelte Aufsätze, München : Chr. Kaiser, 1952, v. I, p. 50, formulou assim: “O batismo é a concessão da nova vida e a nova vida é a apropriação do batismo”. Cf. também Wolfgang SCHRAGE, Ethik des Neuen Testaments, Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1982. p. 164s (NTD Ergänzungsreihe 4); Gerhard BARTH, op. cit., p. 117s.

25Veja Otfried HOFIUS, Glaube und Taufe, Zeitschrift für Theologie und Kirche, Tübingen, v. 91, n. 2, p. 134s, 1994; Walter KASPER, Glaube du Taufe, in: id., Christsein ohne Entscheidung, oder soll die Kirche Kinder taufen?, Mainz: Matthias Grünewald, 1970, p. 129-159.

26Já citado por mim em Enfoques Bíblicos, p. 60. Também M. KRUSE (op. cit., p. 64) admite que a fé não pode ser medida, e, sim, somente a “declaração de crença”. Nesse caso, porém, já não mais se pode falar de “batismo de crentes”, como o fazem muitos anabatistas ainda hoje, mas somente de “batismo de confessantes”.

27Otfried HOFIUS, op. cit., p. 151 e muitos outros. O mesmo vale para a santa ceia. Também participação indigna, sem fé, não anula o sacramento.

28Com relação a esse artigo, sua história prévia e seus objetivos, veja Gunter WENZ, Theologie der Bekenntnisschriften der evangelisch-lutherischen Kirche, Berlin / New York, 1996, p. 605s.

29Edmund SCHLINK, op. cit., p. 91.

30Essa é uma ênfase muito justa de Otto WEBER. Grundlagen der Dogmatik. Neukirchen-Vluyn : Neukirchener, 1962 v. II, p. 667.

31Edmund SCHLINK, op. cit., p. 61s.

32Com referência ao assunto, Gerhard BARTH, op. cit., p. 60s.

33Este é um dos justos destaques de Wilfried HÄRLE, op. cit., p. 551s. Boa avaliação dos prós e contras do batismo de lactentes nas p. 552s.

34Pergunto-me se a diferença básica entre a minha posição e a de M. Kruse não reside exatamente aí. Kruse escreve: “O batismo sempre é, por conseqüência, parte (não todo) da resposta humana à palavra de Deus. Se alguém requer o batismo, o faz porque ouviu a palavra de Deus (...)” (o destaque é do autor). Batismo e palavra de Deus, pois, seriam duas coisas distintas. Nesse caso, é claro, a profissão de fé não pode faltar. A questão nos remete de novo à exegese dos textos bíblicos.

35Veja Marc LIENHARD, Martim Lutero: tempo, vida, mensagem, São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 189s; Karl Heinz zur MÜHLEN, Luthers Tauflehre und seine Stellung zu den Täufern, in: Helmar JUNGHANS (Ed.), Leben und Werk Martin Luthers von 1526 bis 1546, 2. ed., Berlin: Ev. Verlagsanstalt, 1985. v. I, p. 119s. Entre estes anabatistas não estava Menno Simons.

36Não me arrogo o direito a um juízo nesse tocante. Baseio-me no exposto em VELKD, Handbuch Religiöse Gemeinschaften, Gütersloh: Gerd Mohn, 1978, p. 32s, bem como em manifestações da Assembléia de Deus, por exemplo. Clareza de posição não exige necessariamente o anátema do dissidente. Exige isto, sim, a discussão e a tentativa de reconciliar as divergências. Quanto ao presbiterianismo, veja a instrutiva obra já mencionada de Carlos Jeremias KLEIN, Presbiterianismo brasileiro e rebatismo (nota 16).

37Veja Wilhelm HÜFFMEIER, op. cit.; Walter ALTMANN, op. cit.; e outros. A posição do jovem Lutero tem sido outra do que a do Lutero posterior. Cf. as citações em meu ensaio em Enfoques Bíblicos, p. 59s. Certo é que, para Lutero, o batismo sempre tem sido obra de Deus. “Ser batizado em nome de Deus significa ser batizado por Deus mesmo e não pelo homem”. Citação conforme Wilfried BUCHWEITZ, Batismo – Conversão, Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 20, n. 3, p. 143, 1980.

38Dietrich BONHOEFFER, Discipulado, São Leopoldo: Sinodal, 1980, p. 9s.

39Veja o instrutivo diagnóstico apresentado por Wilfried BUCHWEITZ, op. cit., p. 146s.

40Remetemos a Martin VOLKMANN, Catecumenato Permanente – um desafio que permanece, Estudos Teológicos. São Leopoldo, v. 34, n. 3, p. 205s, 1994, bem como às demais contribuições sobre o assunto, no mesmo caderno.